Um Segredo Entre Nós

23 01 2012

Título original: (Fireflies in the Garden)
Lançamento: 2008 (EUA)
Direção: Dennis Lee
Atores: Ryan Reynolds, Emily Watson, Carrie-Anne Moss, Hayden Panettiere.
Duração: 99 min
Gênero: Drama

Sinopse
Michael Waechter (Ryan Reynolds) é um escritor que está de volta à casa de sua infância, devido à tardia formatura de sua mãe, Lisa (Julia Roberts). Charles (Willem Dafoe), pai de Michael, discute com a mulher no carro e termina causando um acidente, no qual Lisa morre. Envolvido com o ocorrido e a descoberta do passado da mãe, Michael precisa ainda decidir se irá publicar “Fireflies in the Garden”, seu novo livro, no qual expõe as memórias de sua infância complicada.
Fonte: http://www.adorocinema.com/filmes/segredo-entre-nos/

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Reflexões sobre o filme

Um segredo entre nós

O filme trata da relação de uma família disfuncional. Uma história de equívocos humanos que em algum nível muitos de nós vivemos.

No filme fica claro o sofrimento e os traumas vividos por Michael em sua infância. Os traumas e estímulos negativos repetidos nessa idade nem sempre ficam tão claros, muitas vezes são sutis e encobertos por disfarces múltiplos, tais como:  crítica, gracejo ou comentário desqualificador  repetido muitas vezes; exigência jamais satisfeita; repressão de sentimentos, emoções e instintos; repressão da autêntica expressão; comportamentos e atitudes contraditórias e exigências descabidas; ausência de proteção, de cuidados ou de assistência, omissão; falta de diálogo, de consideração, de elogios gratuitos; exigência de responsabilidade desproporcionais a idade; desrespeito a individualidade  e singularidade dos filhos; comparação entre eles, preferências para direção do amor e atenção; rejeição de comportamentos por preocupação com a opinião alheia, em detrimento as reais necessidades dos filhos; a superproteção, a falta de limites, cobertura das distorções dos filhos, aquiescência e leniência ao erro, são também estímulos negativos e prejudiciais, apesar de não tão evidentes.

O comportamento disfuncional explícito de Charles, com sua exigência perfeccionista, atitude agressiva, na conduta desqualificadora e punitiva, saltam aos olhos e é facilmente detectável. Muito mais difícil é perceber outras disfuncionalidades em comportamentos mais sutis, mascarados por disfarces de boa conduta, de adequação e civilidade.

É preciso perceber a disfunção da submissão, da omissão e da não proteção por traz da educação, fineza e magnanimidade do comportamento de Lisa, mãe de Michael.

Charles não era o vilão, e Lisa não era a vítima e nem tampouco somente uma boa pessoa que tolerava as inadequações do marido. Ambos eram responsáveis pela disfunção daquela família. Ela era cúmplice e co-responsável. Na omissão era igualmente disfuncional e negava também para si e para os filhos a realidade. Buscou outro homem como escape de sua infelicidade e planejava deixar o marido assim que estivesse segura financeiramente. Era humana e falha como Charles e todos nós, apesar de sua atitude discreta.

Se os adultos são responsáveis por suas ações e/ou omissões, seria então os filhos as reais vítimas desta situação? Os pais seriam os culpados e os filhos totalmente inocentes e, portanto, vítimas injustiçadas? E se os pais, em suas distorções, são frutos das distorções e ignorância dos pais deles, que por sua vez, dos pais dos pais deles, então, de quem é a culpa? Se de fato eles reproduziram o que vivenciaram?

Por que filhos de mesmos pais, que receberam em algum nível estímulos e tratamento semelhante, reproduzem no futuro um comportamento muitas vezes tão diferentes? Porque uns superam mais fácil do que outros?
Se a personalidade é fruto do meio, o que define a individualidade, se ela é tão distinta?

Se somos vítimas de nossos pais e, portanto, isento de responsabilidades e se nossa conduta distorcida, são apenas uma consequência das deles,  de quem é a responsabilidade pelas disfunções de nossos filhos?

Se ninguém é culpado sozinho, não será porque todos nós somos igualmente responsáveis em algum nível?

Será que o verdadeiro culpado não é a nossa ignorância e a nossa imperfeição humana? E se todos somos humanos e imperfeitos, uma solução não poderia ser buscarmos em nós mesmos as nossas distorções e as corrigirmos? Se não somos vítimas, não seria mais proveitoso parar de se lamentar, se lastimar e se esforçar para a própria mudança e transformação pessoal?

Seguindo esse raciocínio é importante refletir a ideia de que se não somos culpados únicos e nossos pais também não o são, isso não significa que eles ou nós não sejamos responsáveis pelas feridas que causamos.

Mesmo que tenhamos justificativas para nossas falhas e nossos pais , avós e ascendentes também, isso não nos exime da responsabilidade que de um dia termos causado ferida a alguém. Temos o direito de sentir nossas dores e nossas emoções pelo fato de termos sido feridos, da mesma forma que temos que dar o direito de quem tenhamos ferido, de sentir o mesmo.

Temos todos o direito de sentir e digerir e processar esses sentimentos, provavelmente só assim poderemos perdoar aos que nos feriram e perdoar a nós mesmos a ferida que causamos.

O diretor do filme nos lembra que os acontecimentos trágicos, aproxima e diminui as distâncias. Michael escolhe guardar o segredo da família, não publicando o livro autobiográfico, pois percebe que também teve bons momentos com seu pai, portanto, talvez tenha se dado conta que estava fixado apenas num lado de sua história.

No fim, até onde a história do filme conta, podemos perceber, o que também acontece na vida real: sem processarmos a nossa dor e curá-la dentro de nós,  jamais poderemos  curar a separação e a mágoa entre nós e quem nos feriu.

Por Flávio Vervloet





Um Beijo Roubado

30 07 2009

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Sinopse
Nova York. Jeremy (Jude Law) administra um pequeno café e restaurante. Muito irritada, Elizabeth (Norah Jones) descobre que seu namorado comeu lá com outra mulher. Zangada com a traição dele, ela rompe o namoro e deixa suas chaves com Jeremy, caso seu ex-namorado as queira de volta. Elizabeth retorna ao café várias vezes e ela e Jeremy começam a se sentir bem atraídos um pelo outro. Mesmo assim ela sai da cidade e então viaja de ônibus para Memphis, Tennessee, onde tem dois empregos, pois quer economizar para comprar um carro. Sem revelar onde vive ou trabalha, ela manda um cartão-postal para Jeremy, que fracassa ao tentar localiza-la. Elizabeth conhece pessoas como o policial Arnie Copeland (David Strathairn), que se tornou alcoólatra pois não aceita o fato de Sue Lynne (Rachel Weisz), sua esposa, tê-lo deixado. Elizabeth testemunha o trágico desdobramento desta separação e, já em Nevada, conhece Leslie (Natalie Portman), que adora jogar pôquer por garantir que sabe “ler” o rosto das pessoas.

Fonte: http://www.adorocinema.com/filmes/beijo-roubado/beijo-roubado.asp

Reflexões sobre o filme
Tema: Relacionamentos
Subtema: Dificuldade de deixar ir, de que a vida siga seu fluxo e de lidar com perdas.

O filme trata de personagens incomuns, sensíveis e humanas.Elizabeth sofre uma perda afetiva e tenta entender o porquê. Não se conforma com o acontecido, não conseguindo se vê sem aquela pessoa em sua vida. O policial Arnie Copeland se tornou alcoólatra, pois não aceita o fato de Sue Lynne sua esposa, tê-lo deixado. Sue Lynne se afasta do marido que a sufocava, ansiava se ver livre dele e com sua morte sente a dor de não ter mais a garantia de seu amor. Todos com dificuldade de deixar que a vida siga seu fluxo após uma perda afetiva.

Uma jogadora profissional, Leslie, que adora jogar pôquer por garantir que sabe “ler” o rosto das pessoas, mas que não conhece sequer a si própria, tem uma relação difícil com o pai que a ensinou a não confiar em ninguém. Também com dificuldade de deixar o passado de sua relação com este pai a que se mantém presa até a vida adulta, apesar de se achar livre.

Um pote de chaves perdidas à espera de fechaduras para serem abertas que Jeremy mantinha como uma forma de se manter ligado a Katya, seu antigo relacionamento que lhe falou sobre a importância de manter estas chaves guardadas.

O filme traz uma reflexão, sobre a importância de liberar o passado para viver o presente. Como se abrir para o novo ainda preso no passado? como se abrir para um novo relacionamento ainda com o coração ocupado pelo vinculo desfeito ou que não deu certo?É natural que levemos um tempo para cicatrizar nossas feridas, tempo esse que varia de pessoa para pessoa. Mas é comum muitas vezes prolongarmos este tempo e nos apegarmos ao passado, ao conhecido, mesmo que não tenha sido assim tão bom. Agarramo-nos ao conhecido porque, esse podemos controlar e aparentemente evitarmos o sofrimento. Nos fechamos para o novo na esperança de não sofrermos e muitas vezes sofremos ainda mais, remoendo a dor da perda.
Se permitir o luto da perda na maioria das vezes é a melhor forma de processarmos esta perda. Senti-la, vive-la, expressa-la até que ela seja absorvida e a experiência ganhe um sentido maior. Mas ao negá-la ou nos apegarmos a ela nos a prolongamos e a mesma não pode ser integrada.

Outra mensagem significativa do filme é a das tortas de blueberry que nunca são comidas porque todos preferem as de outros sabores, mas que todos os dias, mesmo assim, são feitas novamente, na insistência que lembra a importância do valor de todos os sabores e a importância das diferenças individuais. Traz para reflexão sobre o valor e a riqueza das diferenças. A importância de considerarmos que apesar dos sabores conhecidos e buscados, eleitos como os desejáveis, há também os sabores exóticos, incomuns que são muitas vezes os inesquecíveis. Todos nós temos, além de nossos sabores/qualidades comuns e expostos porque desejáveis pela maioria, sabores/qualidades incomuns e raros que nos fazem únicos. Se nos prendemos ao comum e conhecido como podemos provar o inusitado e inesquecível? A espontaneidade mora por traz do ato e comportamento comum e por isto mesmo seguro, mas como acessar a espontaneidade se agarrando no conhecido e seguro?

Elizabeth no filme ousava na sua diferença ser esta torta de sabor distinto de todas as outras e Jeremy também se identificava com esta diferença, por isto insistia em mantê-la pronta em oferta apesar de não comê-la. O nome do filme (My Blueberry Nights) é uma referencia a importância desta diferença rejeitada por ser incomum, mas de igual valor.

Por Flávio Vervloet